1439 lugares
e eu era a única negra

há espíritos fortes que falam
de racismo
enquanto assistem carmina burana

[eu quebro]

o primeiro ato
é o roubo

quero escrever coisas outras
pássaros vaginas janelas o clima
as lentes o detergente

roubaram de mim
de você desse lápis
desse teclado
a escrita da poesia qualquer

enquanto o cérebro
escurta o circuito
a medicação tropeça
enquanto sou como todas
as outras poetas

fui roubada

quero sofrer como todos
os loucos
e das palavras que surtam
peneirar
a estética

mas se atente
ao movimento
dos furtos clássicos
históricos e afinados

entre todas essas que versam
um papel me foi restado

quantas negras eu questiono
o que escrevem
essas negras

o primeiro ato
é sempre um trato

assinei esse papel
de única e exceção
e agora minhas frases
são fronteiriças

e beatriz eu só queria
escrever sobre as paredes
os olhares e as cadeiras
os baralhos os abismos

1439 lugares
e eu era a única negra

eu deveria estar feliz
porque ocupei esse espaço
montei essa ocupação
solitária
de uma bandeira
parda

[eu quebrei
em mil pedaços]

eu deveria estar feliz
mas beatriz eu só queria
escolher uma poesia
beatriz eu só queria

como todas as poetas
as negras também
surtam

mas o primeiro
ato
é sempre uma
pergunta

onde estão as
negras
onde estão
as negras

[onde estão as negras]

poema do meu livro “um buraco com meu nome”, para beatriz nascimento.

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